Um político alemão do primeiro escalão defendeu a introdução de uma "lei islâmica" que limitaria a influência de imãs estrangeiros e proibiria o financiamento externo de mesquitas na Alemanha.
A proposta — baseada na Lei Islâmica promulgada na Áustria em fevereiro de 2015 — tem como objetivo manter distância do extremismo e promover a integração muçulmana através da criação de um "Islã europeu" moderado.
A iniciativa ocorre em meio a revelações de que o governo turco está pagando os salários de cerca de 1.000 imãs conservadores, dentro da Alemanha, que conduzem mesquitas ao redor do país. Além disso, a Arábia Saudita recentemente se comprometeu em financiar a construção de 200 mesquitas na Alemanha para dar assistência aos candidatos a asilo.
Em uma entrevista concedida ao jornal Die Welt, Andreas Scheuer, Secretário Geral da União Social Cristã (CSU), partido bávaro irmão da União Democrata Cristã (CDU) da Chanceler Alemã Angela, assinalou que Berlim deveria restringir o financiamento turco de mesquitas na Alemanha e começar a formar e certificar seus próprios imãs. Senão, argumenta ele, a integração muçulmana será difícil ou até impossível de se concretizar. Ele ressaltou o seguinte:
"Precisamos ser mais críticos ao lidarmos com o Islã político, porque ele obstaculiza a integração muçulmana em nosso país. Precisamos de uma Lei Islâmica. O financiamento de mesquitas e jardins de infância que vem do exterior, por exemplo da Turquia ou Arábia Saudita, deveria ser proibido. Todos os imãs devem ser formados na Alemanha e compartilhar nossos valores fundamentais.
"Não é possível aceitarmos a importação de valores diferentes, alguns deles radicais, de outros países. O alemão deve ser a língua falada nas mesquitas. A Europa evoluída deve cultivar seu próprio Islã.
"Ainda estamos no início da nossa jornada. Temos que começar agora. Não podemos de um lado promulgar uma Lei de Integração e de outro fechar os olhos em relação ao discurso religioso pregado nas mesquitas e por quem ele é pregado".
As observações de Scheuer vêm em meio a denúncias de que o governo turco enviou 970 clérigos — cuja maioria não fala alemão — para conduzir 900 mesquitas na Alemanha controladas pela União Turco-Islâmica para Assuntos Religiosos (DITIB), ramo da Superintendência para Assuntos Religiosos do governo turco, conhecido em turco como Diyanet.
Os sucessivos governos alemães são os responsáveis por este estado de coisas. Em um artigo o jornal Der Tagesspiegel observa: "nas últimas décadas, o governo federal comemorou o fato da autoridade religiosa turca exercer forte influência sobre as mesquitas alemãs. A Turquia era considerada um estado secular e a sua influência era vista como escudo contra o extremismo religioso".
Isso foi antes do Presidente da Turquia Recep Tayyip Erdogan embarcar em uma missão para transformar a antiga nação secular em um país islâmico.
De acordo com o jornal Die Welt, Erdogan aumentou o tamanho, alcance e poder do Diyanet, que atualmente conta com um orçamento de 6,4 Liras turcas (US$2,3 bilhões; €1,8 bilhões), que representa mais do que 12 ministérios turcos, incluindo o ministério do interior e o ministério das relações exteriores. O Diyanet conta com um quadro de 120.000 funcionários, um salto dos 72.000 em 2004.
Os clérigos turcos na Alemanha são efetivamente servidores públicos a serviço do governo turco. Críticos de Erdogan o acusam de usar as mesquitas da DITIB para impedir que os migrantes turcos se integrem à sociedade alemã.
O político alemão Cem Özdemir, co-presidente do Partido Verde, ressaltou que a DITIB "nada mais é do que a extensão do braço do estado turco". Ele acrescenta: "em vez de ser uma organização religiosa legítima, o governo turco transformou a DITIB em uma organização política de fachada do partido AKP de Erdogan. A Turquia precisa abrir mão dos muçulmanos na Alemanha".
Erdogan alertou repetidamente os imigrantes turcos a não se assimilarem à sociedade alemã.
A Mesquita Central de Colônia, dirigida pela DITIB é usada como base central na Alemanha da agência de inteligência turca, de onde é dirigido o "esquadrão de criminosos" cuja tarefa é aplicar "severas punições" aos dissidentes turcos na Alemanha. (imagem: © Raimond Spekking/CC BY-SA 4.0, via Wikimedia Commons) |
Durante uma visita a Berlim em novembro de 2011, Erdogan declarou: "assimilação é uma violação dos direitos humanos". Em fevereiro de 2011, Erdogan disse a uma multidão de mais de 10.000 imigrantes turcos em Düsseldorf: "somos contra a assimilação. Ninguém deve ter condições de arrancar de nós nossa cultura e civilização". Em fevereiro de 2008, Erdogan disse a 16.000 imigrantes turcos em Colônia que a "assimilação é um crime contra a humanidade".
Por seu lado, o Rei Salman da Arábia Saudita anunciou recentemente um plano para financiar a construção de 200 mesquitas na Alemanha a fim de prover as necessidades espirituais aos migrantes e refugiados que aportaram em 2015. As mesquitas irão, presumivelmente, professar o wahhabismo, a forma oficial e dominante do Islã sunita da Arábia Saudita. O wahhabismo é uma forma rigorosa do Islã que insiste na interpretação literal do Alcorão.
Em 11 de abril, Hans-Georg Maassen, chefe da Agência de Inteligência Interna da Alemanha (BfV), soou o alarme diante do crescente número de mesquitas radicais de língua árabe na Alemanha. "Muitas mesquitas são controladas por fundamentalistas e estão sendo monitoradas por conta da sua orientação salafista", ressaltou Maassen em uma entrevista concedida ao jornal Welt am Sonntag. Ele acrescentou que muitas dessas mesquitas estavam sendo mantidas por doadores da Arábia Saudita.
Ainda é incerto, contudo, se Merkel irá apoiar a "Lei Islâmica", que certamente irá contrariar Erdogan, visto que ele efetivamente controla as comportas da imigração em massa de muçulmanos para a Europa. Se Merkel apoiar abertamente a proibição de financiamento externo de mesquitas na Alemanha, Erdogan provavelmente irá rescindir o acordo EU/Turquia no tocante aos migrantes, acordo este que Merkel necessita desesperadamente para conter o fluxo da migração em massa para a Alemanha. Este é mais um indício do tremendo poder acumulado por Erdogan frente à estratégia política de Merkel e da Alemanha.
O governo de coalizão da Alemanha, entretanto, fechou um acordo quanto à nova "Lei de Integração".
Em 14 de abril Merkel anunciou as linhas gerais da nova legislação, que irá explicar claramente os direitos e as responsabilidades dos migrantes na Alemanha. Segundo a lei, cujo texto será concluído até 24 de maio, os candidatos a asilo serão obrigados a comparecerem às aulas da língua alemã e participarem de treinamento para a integração, caso contrário seus benefícios serão cortados.
O governo se comprometeu a facilitar aos candidatos a asilo o acesso ao mercado de trabalho alemão com a promessa de criar 100.000 novas "oportunidades de trabalho". O governo também irá suspender uma lei que determina aos empregadores que deem preferência aos candidatos alemães ou da União Européia em relação aos candidatos a asilo.
No afã de evitar a disseminação de guetos de imigrantes na Alemanha, a nova lei, cuja expectativa é que entre em vigor ainda neste verão, irá proibir aos refugiados que escolham onde irão morar até a concessão do asilo. Os migrantes que abandonarem as moradias designadas pelo estado sofrerão sanções ainda não especificadas.
A nova lei também incluirá cláusulas contra o terrorismo, que permitirão às agências de inteligência alemã trabalharem em estreita colaboração com seus colegas europeus, da OTAN e israelenses.
"Nós teremos uma lei alemã no tocante à integração", assinalou Merkel. "Esta é a primeira vez desde a Alemanha do pós guerra que isso acontece. É um passo importante e qualitativo".
Os críticos porém dizem que a lei proposta não vai longe o suficiente porque ela não ameaça com deportação os imigrantes que se recusarem a se integrar. Na entrevista ao Die Welt, Scheuer insistiu que os imigrantes muçulmanos terão que se integrar ou serão deportados:
"Qualquer um que não comparecer aos cursos de integração e de língua alemã atesta que não está disposto a se integrar ou a aceitar nossos valores. Além disso, é importante que as pessoas que queiram ficar na Alemanha se registrem na Agência Federal de Emprego (Bundesagentur für Arbeit) e cuidem da sua própria subsistência. A mensagem é clara: aqueles que não se integrarem não poderão ficar aqui. Temos que acabar com as visões românticas da integração. O multiculturalismo não deu certo. Aqueles que não se integrarem devem contar com a deportação".
Soeren Kern é colaborador sênior do Gatestone Institute sediado em Nova Iorque. Ele também é colaborador sênior do European Politics do Grupo de Estudios Estratégicos / Strategic Studies Group sediado em Madri. Siga-o no Facebook e no Twitter. Seu primeiro livro, Global Fire, estará nas livrarias em 2016.