Um artista do rap alemão que virou jihadista convidou seus seguidores a cometerem ataques terroristas na Alemanha.
Em um vídeo de alta qualidade distribuído em abril pelo grupo terrorista Estado Islâmico, Denis Cuspert também alerta que células adormecidas se infiltraram na Alemanha e estão prontas para serem ativadas.
As autoridades alemãs dizem estar levando as ameaças a sério: Cuspert, que tem sido comparado ao Ministro da Propaganda Nazista Joseph Goebbels, se tornou o principal chefe da propaganda do Estado Islâmico no idioma alemão e é excepcionalmente capaz de inspirar jovens alemães desiludidos a se tornarem jihadistas.
A transformação de Cuspert de artista do rap em jihadista encontra-se documentada em uma análise de 25 páginas elaborada pelo serviço de inteligência alemão, que o retratou como "simplesmente o marqueteiro mais interessante do movimento salafista no âmbito do idioma alemão".
Cuspert, 39, nasceu em Berlim, filho de mãe alemã e pai ganense. O pai abandonou a família quando Cuspert ainda era bebê e a mãe casou novamente com um oficial militar afro-americano, com quem Cuspert teve um relacionamento extremamente conturbado.
Talvez em busca de uma identidade, em 1995 Cuspert embarcou em uma carreira de artista do rap na qual procurava imitar artistas americanos do hip-hop. Também conhecido pelo nome artístico de Deso Dogg, ele acabou indo para a prisão por ter cometido uma série de crimes, inclusive crimes relacionados a drogas. Nos anos seguintes, ele lançou quatro álbuns, mas depois de sobreviver milagrosamente a um acidente de carro em outubro de 2008, começou a se interessar pelo Islã salafista.
Em 2010, Cuspert abandonou a carreira de artista do rap abraçando formalmente o Islã. Trocou o nome artístico pelo nome islâmico Abou Maleeq e começou a cantar hinos de guerra islâmicos conhecidos como nasheeds, nos quais ele mostrava uma obsessão com o martírio.
As nasheeds "pop jihad" de Cuspert chamaram a atenção depois que Arid Uka, um muçulmano albanês kosovar de Frankfurt, assassinou dois pilotos dos EUA e feriu outros dois no Aeroporto de Frankfurt em março de 2011. No tribunal, Uka declarou que instantes antes de efetuar o ataque, ele estava ouvindo uma nasheed convocando ataques contra não-muçulmanos em seu iPod. Ele disse que também tinha sido influenciado por um vídeo de Cuspert na página do Facebook.
Enquanto isso, Cuspert acabou se envolvendo com Mohamed Mahmoud, um islamista nascido na Áustria que fundou a Millatu Ibrahim, uma organização salafista na cidade alemã de Solingen em 2011. O grupo convidava os muçulmanos alemães a rejeitarem a lei alemã e em seu lugar obedecerem a lei da Sharia.
O governo alemão baniu a organização Millatu Ibrahim em maio de 2012 e Mahmoud, também conhecido como Abu Usama Al-Gharib, fugiu para o Egito para lá reconstruir o grupo. "Eu voltarei para a Alemanha sob uma única condição, como conquistador para introduzir a Sharia na Alemanha", disse Mahmoud naquela época.
Em um vídeo de três minutos, um salafista alemão ligado a Mahmoud autodenominado Abu Azzam jurou vingança, conclamando o assassinato da Chanceler Alemã Angela Merkel. Ele alerta:
"nossas tropas já estão lá (na Alemanha), vocês irão sangrar, suas cabeças irão rolar... Oh Alá, dê ao povo alemão o que ele merece!
"Ao relembrarmos a primavera árabe, nos vemos ansiosos pelo verão europeu. Queremos ver Obama e Merkel mortos".
Com o passar do tempo, Mahmoud convenceu mais de uma dúzia de salafistas alemães a se juntarem a ele no Egito, na época em que a Irmandade Muçulmana estava ascendendo naquele país. Entre eles estava Cuspert, que conseguiu escapar da Alemanha em junho de 2012, muito embora estivesse sendo vigiado pela inteligência alemã.
Depois de chegar ao Egito, Cuspert adquiriu armas de fogo em um campo de militantes em Mersa Matruh, situado cerca de 200 km a leste da fronteira com a Líbia. Em seguida ele viajou para a Líbia para receber treinamento com extremistas islâmicos antes de se tornar jihadista na Síria no início de 2013.
Em agosto de 2013, Cuspert apareceu em um vídeo de quatro minutos no qual ele expressa o desejo de morrer como homem bomba, presumivelmente na Alemanha. Ele pode ser ouvido cantarolando a letra da música a seguir:
"eu desejo a minha morte e mal posso esperar por ela, armado com bombas e granadas, dentro dos quartéis dos cruzados, apertando o botão, al-Jannah (paraíso), al-Jannah,
eu detono a bomba no meio da multidão, apertando o botão, al-Jannah, al-Jannah,
bem no centro da cidade ou no metrô, apertando o botão, al-Jannah, al-Jannah,
com um sorriso direto para o meu Criador, apertando o botão, al-Jannah, al-Jannah,
lembre-se de suas obrigações e tema Alá, apertando o botão, al-Jannah, al-Jannah".
Acredita-se que Cuspert, que agora usa o cognome Abu Talha Al-Almani (Abu Talha o alemão), tenha se juntado formalmente ao Estado Islâmico por volta de abril de 2014. Também circularam boatos que ele tinha sido morto na Síria no mesmo mês, mas em novembro de 2014 ele apareceu em um vídeo do Estado Islâmico. Ele estava segurando uma cabeça decapitada enquanto explicava em alemão que as vítimas tinham lutado contra o Estado Islâmico e "isso explica porque eles foram condenados à morte".
No último vídeo, datado de abril de 2015, Cuspert pode ser ouvido cantando as seguintes letras em alemão:
"aos inimigos de Alá. Onde estão suas tropas? Não podemos esperar mais. Oh Alá, destrua-os! Conceda-nos a vitória sobre eles. Tire de nós. Faça-nos honrados. Tire de nosso sangue. Fisabilillah (aquele que luta pela causa de Alá).
"Agora ouçam, cachorros do inferno. Está escrito. A tinta já secou. Vocês já foram julgados. Seu fim está próximo.
"Soldados mutilados estão voltando para a sua terra natal, praticamente desesperados. Sem olhos. Corpos sem pernas. Nós queremos seu sangue. Ele tem um sabor delicioso.
"Na França, já foi comprovado com fatos. Na Alemanha, células adormecidas estão esperando a hora. Os irmãos estão operando. Aterrorizando o Kafir (infiel).
"Nós já sentimos o odor do sangue. A vingança em homenagem ao mensageiro. Em homenagem às nossas irmãs. Aos nossos nobres irmãos. A todos os mártires.
"Um caminhão lotado de explosivos. Adeus amoroso. Não fique triste minha mãe. Seu filho corre para o encontro de Alá.
"Alá chamou. Não há como escapar. Encha o tanque do seu carro com combustível. Meu irmão, apresse-se! Seu vizinho é um Kafir. Difamando o mensageiro. Pegue uma faca bem grande e dê a ele o que ele justificadamente merece!
"Mesmo que você esteja na Europa, faça a sua jihad. Alá irá recompensá-lo. Acabe com o imundo. O paraíso espera por você. Aja com sinceridade.
"Temos apenas uma vida. E ela nos foi dada por Alá. O tempo está se esgotando. De modo que, irmão lute com bravura. Proezas fazem a diferença. A terra está tremendo. Khilafah (Califado), que bênção. Uma graça de Alá.
"Todos eles morrem por uma única causa. Você morre ou é vitorioso. Não há outro deus a não ser Alá".
As autoridades alemãs estão agora procurando meios para dificultar o potencial retorno de Cuspert à Europa. Em 8 de fevereiro, o jornal Die Welt revelou que os promotores públicos estavam investigando 83 jihadistas alemães, inclusive Cuspert, por crimes de guerra e atrocidades cometidas em nome do Estado Islâmico. Se for condenado, Cuspert, ao retornar à Alemanha, poderá ficar o resto da vida na prisão.
Em 9 de fevereiro, o Departamento de Estado dos EUA declarou que considera Cuspert um "terrorista global" e em 11 de março a Secretaria de Estado da Economia da Suíça incluiu Cuspert na lista de pessoas proibidas de terem qualquer acesso aos bancos suíços, devido às supostas ligações com atividades terroristas.
Essas medidas, contudo, provavelmente não impedirão Cuspert de produzir mais vídeos de propaganda. Sem a menor sombra de dúvida, esses vídeos representam uma ameaça bem maior à Alemanha do a sua presença física naquele país.
O serviço de inteligência alemão resume a questão da seguinte forma:
"como artista do rap e jihadista, Cuspert representa autenticidade. Essa credibilidade dos campos de batalha contribui para a sua popularidade dentro do cenário jihadista/salafista internacional. ... A aparência ostentosa, porém autentica em seus vídeos de propaganda, juntamente com a atratividade de um Estado Islâmico atualmente vitorioso, conta com um considerável poder de mobilização para com indivíduos já radicalizados na Alemanha que querem viajar para a Síria. Sua propaganda demagógica seduz os jovens com promessas ostensivas de paraíso, mas os leva à ruína.
"A propaganda jihadista/salafista desse tipo produzida por Cuspert é livremente acessada na Internet e carrega o risco das pessoas se radicalizarem e responderem, não apenas ao chamamento para viajar e lutar no exterior, mas também para apoiar grupos terroristas como o Estado Islâmico aqui na Alemanha. Como consequência, o cenário salafista está pronto para se tornar cada vez mais violento além de multiplicar suas fileiras".
Soeren Kern é colaborador sênior do Gatestone Institute sediado em Nova Iorque. Ele também é colaborador sênior do European Politics do Grupo de Estudios Estratégicos / Strategic Studies Group sediado em Madri. Siga-o no Facebook e no Twitter.