O novo governo populista interino da Itália pediu demissão em 28 de maio depois que a sua indicação de um ministro da fazenda eurocético foi rejeitada pelo presidente que é Pró-UE, que por sua vez pediu a um tecnocrata, nomeado, para que formasse um governo Pró-UE.
A contenda política acaba com a proposta dos dois partidos 'antiestablishment' da Itália, o Movimento 5 Estrelas de esquerda (M5S) e a Liga de centro-direita, sobre a formação de um governo de coalizão populista, que seria o primeiro dessa natureza na Europa.
A situação política reflete o controle do poder exercido pelo establishment Pró-UE, que obviamente está determinado a defender a austeridade econômica em detrimento da democracia.
O presidente italiano Sergio Mattarella recusou aceitar a nomeação de Paolo Savona de 81 anos, ex-ministro da indústria, para ministro da fazenda que havia classificado a entrada da Itália na Zona do Euro um "erro histórico".
Em seu último livro, "Como um Pesadelo e um Sonho" (Come un incubo e come un sogno), Savona chamou o euro de "prisão alemã", alertando: "precisamos elaborar um plano B para sair do euro, caso seja necessário... a outra alternativa é acabar como a Grécia".
Mattarella, que já havia sido empossado por um governo anterior também Pró-UE, salientou que a "incerteza em relação à nossa posição quanto ao euro alarmou os investidores italianos e estrangeiros que compraram títulos do governo e investiram em nossas empresas". Ele acrescentou que "a adesão ao euro é uma opção crucial para o futuro do nosso país e dos nossos jovens".
Mattarella realçou que queria que o próximo ministro da fazenda fosse alguém "que não fosse visto como defensor de uma linha que pudesse ou até provocasse a saída da Itália da Zona do Euro".
Agora Mattarella pediu a Carlo Cottarelli, ex-funcionário do Fundo Monetário Internacional, que formasse um governo composto por tecnocratas nomeados. Conhecido como "Sr. Tesoura" por fazer cortes nos gastos públicos, Cottarelli provavelmente visará manter a rigorosa disciplina fiscal imposta pela Alemanha ao bloco monetário do euro.
O presidente italiano Sergio Mattarella, pediu a Carlo Cottarelli (foto acima), ex-funcionário do Fundo Monetário Internacional, que formasse um governo composto por tecnocratas nomeados. Cottarelli é conhecido como "Sr. Tesoura" por fazer cortes nos gastos públicos. (Foto: Stephen Jaffe/IMF via Getty Images) |
Em 17 de maio a Liga e o M5S, partidos populistas rivais, agora juntos em um governo de coalizão, publicaram o acordo de 39 páginas chamado: "Contrato para um Governo de Mudança". Em uma síntese de duas páginas mais parece o "Acordo com o Eleitor Americano" do Presidente dos EUA Donald J. Trump.
Com o intuito de estimular o crescimento econômico, a Liga prometeu reduzir impostos, ao passo que o M5S prometeu aumentar os gastos públicos.
A previsão de crescimento do PIB italiano é de apenas 1,5% em 2018, o mesmo patamar de 2017, portanto o pior desempenho das 19 nações da Zona do Euro.
A Itália já ocupa o terceiro lugar no ranking da dívida pública do planeta, com um total de US$2,7 trilhões. Em relação ao PIB, a dívida pública da Itália bateu nos 130%, o mais alto da Zona do Euro perdendo somente para a Grécia.
A Liga e o M5S prometeram reduzir a dívida pública incrementando o crescimento, estimulando a demanda doméstica, promovendo as exportações, em vez de fazer uso de "intervenções com base em austeridade e aumento de impostos".
O acordo de coalizão também prevê: imposto fixo, simplificação do código tributário, aumento dos benefícios de aposentadoria e maternidade, repressão à corrupção na esfera governamental e ao crime, deportações céleres de migrantes ilegais, aumento dos gastos com defesa visando tornar a Itália um "parceiro privilegiado" dos Estados Unidos e a revisão dos tratados da UE no que diz respeito à política monetária.
O líder do M5S Luigi Di Maio fez duras críticas à iniciativa Pró-UE do Presidente Mattarella e pediu que o presidente passasse por um processo de impeachment por ultrapassar os limites de sua autoridade:
"Na Itália a democracia tem um problema. É possível ser um criminoso condenado, condenado por fraude fiscal, sob investigação por corrupção e mesmo assim ser ministro... mas se você criticar a Europa, não poderá ser ministro da fazenda na Itália".
O líder de Liga, Matteo Salvini, também criticou a atitude de Mattarella, mas se recusou a se juntar ao pedido de impeachment de Di Maio:
"Um governo na Itália não tem condições de ser formado sem a aprovação de Berlim, Paris ou Bruxelas. É uma loucura. Eu quero que a Itália volte a ser um país livre."
Agora Cottarelli deve formar um governo que depois terá que ser sancionado pelo parlamento, onde o M5S e a Liga detêm maioria em ambas as casas. Portanto, Cottarelli provavelmente só irá liderar um governo de transição até que sejam convocadas eleições antecipadas, o que poderia acontecer em 9 de setembro, segundo o jornal Corriere della Sera.
Itália, terceira maior economia da Zona do Euro atrás somente da Alemanha e da França, está sem governo desde as eleições inconclusivas de 4 de março, quando a Liga (que disputou a eleição juntamente com uma coalizão de quatro partidos de centro-direita) conquistou a maioria das cadeiras da Câmara dos Deputados e do Senado, tornando-se assim a principal força política.
No entanto, o M5S foi o partido mais votado e ficou em segundo lugar, enquanto a coalizão de centro-esquerda liderada pelo ex-primeiro-ministro Matteo Renzi ficou em terceiro. Portanto, nenhum grupo ou partido político conquistou a maioria absoluta, o que resultou em um parlamento sem uma maioria clara.
"A maioria dos italianos (6 em cada 10) vê isso com bons olhos", segundo um levantamento publicado pelo jornal La Repubblica conforme corroboram os dois líderes dos partidos, segundo Luigi Di Maio, do 5Stars.
Pesquisas recentes mostram que novas eleições poderiam resultar em uma maioria ainda maior a favor do M5S e da Liga. Considerando-se que o possível futuro governo de coalizão entrou em colapso depois que Mattarella rejeitou o eurocético Savona, tanto o M5S como a Liga poderão considerar a próxima eleição como um referendo sobre o papel da Itália na UE.
Soeren Kern é membro sênior do Gatestone Institutesediado em Nova Iorque.