Autoridades de Hamburgo, a segunda maior cidade da Alemanha, começaram a confiscar moradias particulares para mitigar a sua carência - carência esta agudamente agravada pela decisão da chanceler Angela Merkel de permitir a entrada de mais de dois milhões de migrantes no país nos últimos anos.
Desde o final de 2015, autoridades municipais estão se assenhorando de imóveis comerciais, convertendo-os em abrigos para migrantes, quando Merkel abriu as fronteiras alemãs para centenas de milhares de migrantes da África, Ásia e Oriente Médio. Agora, no entanto, a cidade está expropriando unidades residenciais de propriedade de cidadãos comuns.
Em uma medida sem precedentes, as autoridades de Hamburgo confiscaram seis unidades residenciais no distrito de Hamm, perto do centro da cidade. As unidades, de propriedade de um locador privado, precisam ser reformadas além de estarem vagas desde 2012. Um agente administrativo nomeado pela prefeitura está reformando as propriedades para posteriormente alugá-las - contra a vontade do proprietário - aos inquilinos escolhidos por ela. A porta-voz do distrito Sorina Weiland salientou que todos os custos da reforma serão cobrados do proprietário daquelas propriedades.
A expropriação está autorizada pela Lei de Proteção da Habitação de Hamburgo (Hamburger Wohnraumschutzgesetz), uma lei de 1982 atualizada pelo governo socialista da cidade em maio de 2013, para permitir que a prefeitura confisque qualquer unidade de propriedade residencial que esteja vaga por mais de quatro meses.
O arrendamento forçado, o primeiro dessa natureza na Alemanha, segundo consta, tem como objetivo pressionar os proprietários de outras residências vazias na cidade a torná-las disponíveis para serem alugadas. Das 700.000 unidades para aluguel em Hamburgo, algo entre 1.000 e 5.000 (menos de 1%) são consideradas vagas, segundo uma estimativa do Senado de Hamburgo.
Hamburgo, Alemanha. (Imagem: Morris MacMatzen/Getty Images) |
Membros dos partidos socialistas e do Partido Verde de Hamburgo implantaram recentemente um "disque denúncia" onde os residentes locais podem denunciar a existência de propriedades vazias. Ativistas também criaram o site - Leerstandsmelder (Informador de Moradias Desocupadas) - para identificar imóveis desocupados em Hamburgo e demais cidades alemãs.
Ainda não está claro porque o proprietário de Hamm deixou seus apartamentos vagos por mais de cinco anos. Postula-se que dada a localização das propriedades, os custos para reformar podem ter sido demasiado elevados e provavelmente não compensaria reformá-los pela renda que aufeririam.
Outros culpam as autoridades municipais por não aprovarem mais licenças para a construção de novas unidades residenciais. Um estudo realizado em 2012 - bem antes da crise migratória atingir proporções épicas - previu que por volta de 2017, Hamburgo teria um déficit de pelo menos 50.000 imóveis para aluguel.
Em 2016, no entanto, apenas 2.433 novas unidades residenciais foram disponibilizadas, ao passo que somente 2.290 novas licenças de construção foram aprovadas segundo estatísticas fornecidas pela prefeitura de Hamburgo. O número aumentou ligeiramente de 2.192 novas unidades e de 2.041 novos alvarás em 2015.
Em 2012 o governo socialista de Hamburgo apresentou um plano para construir 6.000 novas unidades residenciais por ano. O plano nunca se materializou porque os potenciais construtores tinham que aceitar limitações nos valores dos alugueis impostos pelo governo, o que tornaria impossível aos proprietários recuperarem até mesmo os custos de construção.
A partir daí, a cidade começou a confiscar propriedades privadas para resolver sua autoinfligida crise imobiliária.
Em 1º de outubro de 2015 o Parlamento de Hamburgo (Hamburgische Bürgerschaft) aprovou uma nova lei que autoriza a prefeitura a confiscar imóveis comerciais vazios (prédios de escritórios, espaço para o comércio varejista e terrenos) e usá-los para abrigar migrantes.
Autoridades municipais ressaltaram que a medida era necessária porque, naquela época, mais de 400 novos migrantes chegavam à Hamburgo todo santo dia e todos os abrigos para refugiados estavam lotados. Elas disseram que, pelo fato dos proprietários de imóveis vazios se recusarem a disponibilizar suas propriedades à prefeitura de forma voluntária, deveria ser permitido a ela tomá-las à força.
A medida foi aplaudida pela esquerda. "Estamos fazendo de tudo para que os refugiados não fiquem desabrigados no próximo inverno" ressaltou o Senador Till Steffen do Partido Verde. "Por essa razão precisamos fazer uso de propriedades comerciais vazias".
Já outros argumentaram que as iniciativas do Estado de confiscar propriedades privadas são autocráticas e cheiram comunismo. "O proposto confisco de construções e terrenos privados é uma agressão massiva aos direitos de propriedade dos cidadãos de Hamburgo", assinalou André Trepoll, da União Democrata Cristã de centro direita (CDU). "Isso equivale a uma expropriação executada pelo Estado". Ele afirmou que a medida proposta é uma "lei de intimidação" que equivale a uma "ruptura política com implicações de longo alcance". Ele acrescentou: "os fins não justificam os meios".
Katja Suding, líder do Partido Liberal Democrata (FDP) em Hamburgo, assinalou que a lei proposta "passa dos limites de forma inaceitável... Essas medidas coercitivas só alimentam o ressentimento contra os refugiados".
Medidas semelhantes de expropriação foram propostas em Berlim, capital alemã, mas subsequentemente abandonadas porque foram consideradas inconstitucionais.
Em novembro de 2015 legisladores em Berlim consideraram implantar uma legislação de emergência que permitiria às autoridades locais confiscarem residências particulares para acomodarem candidatos a asilo. A proposta teria autorizado a polícia a invadir casas e apartamentos de propriedade particular, sem um mandado, para que determinasse sua viabilidade para alojar refugiados e migrantes.
A legislação, proposta pelo prefeito de Berlim, Michael Müller do Partido Social Democrata (SPD), de centro esquerda, teria alterado o Artigo 36 da Lei de Segurança e Ordem Pública de Berlim (Allgemeine Gesetz zum Schutz der öffentlichen Sicherheit und Ordnung, ASOG), que atualmente autoriza a polícia a entrar em residências privadas apenas em casos extremos, para "evitar graves ameaças", ou seja, para combater crimes graves. Müller queria expandir o escopo para autorizar inspeções sem mandado incluindo "prevenir a falta de moradias".
A proposta foi mantida em sigilo até o líder do Partido Liberal Democrata (FDP) em Berlim, Sebastian Czaja, alertar que a medida viola a constituição alemã.
"Os planos do Senado de Berlim para requisitar propriedades residenciais e comerciais para acomodar refugiados sem o consentimento do proprietário é uma flagrante violação da constituição. A tentativa do Senado de minar o direito constitucional à propriedade e à inviolabilidade do lar deve ser incondicionalmente rejeitada".
Desde então, tanto o gabinete do prefeito quanto o Senado parecem ter abandonado os ditos planos.
Após uma investigação, Gunnar Schupelius, um colunista do jornal BZ de Berlim, salientou:
"Causou espécie um relato que circulou no fim de semana: o Senado autorizaria a polícia a entrar em casas particulares para abrigar refugiados, mesmo contra a vontade do proprietário. Achei que fosse só uma piada, depois um mal-entendido, porque a Lei Fundamental, Artigo 13, estabelece: "o lar é inviolável".
"De modo que saí em busca da origem do relato e consegui encontrá-lo. Foi a Chancelaria do Senado (Senatskanzlei), ao que tudo indica, que fez circular a 'proposta' entre os senadores. A Chancelaria do Senado é outro nome que se dá ao Gabinete do Prefeito. O secretário em exercício é Björn Böhning (SPD)...
"A proposta é clara: a polícia poderá entrar em propriedades privadas sem ordem judicial para averiguar a possibilidade delas se tornarem abrigo para refugiados se eles estiverem ameaçados de ficarem sem moradia. Isso será permitido sem o consentimento do proprietário. E não é só a polícia que deveria ter tal autorização, mas também as agências reguladoras.
"Esta delicada 'proposta' atraiu pouca atenção pública. Somente o secretário-geral do FDP (Partido Liberal Democrata) de Berlim, Sebastian Czaja, se manifestou alertando para um 'flagrante preparativo para rasgar a constituição'. Internamente deve ter havido protestos: a 'proposta' de repente desapareceu da ordem do dia. Desapareceu para sempre ou será que vai voltar"? "
Ainda não está claro porque ninguém questionou sobre a constitucionalidade da lei de expropriação de Hamburgo.
Enquanto isso, há alemães se perguntando o que os espera: as autoridades limitarão o máximo de espaço vital por pessoa e forçarão aqueles com apartamentos espaçosos a compartilhá-los com estranhos?
Soeren Kern é Colaborador Sênior do Gatestone Institute de Nova Iorque.