Os ataques jihadistas de 22 de março em Bruxelas refletem uma tragédia anunciada. O que causa espanto é que eles não aconteceram antes. O que também surpreende é que não houve mais mortos. Ao que tudo indica, os arquitetos do ataque tinham em mente projetos bem mais espetaculares; eles queriam atacar uma usina nuclear. Outros poderão chegar lá.
Nas últimas duas décadas a Bélgica se tornou o centro nevrálgico da jihad na Europa. O distrito de Molenbeek em Bruxelas já é um território islamista estrangeiro no coração da Bélgica. O distrito, no entanto, não é um território sem lei: a Lei Islâmica (Sharia), para todos os efeitos, substituiu a lei belga. Praticamente todas as mulheres usam véus ou burcas, as que não usam correm perigo. Tráfico de drogas e mesquitas radicais estão por toda parte. A polícia fica fora daquela região e intervém somente em casos de extrema urgência, fazendo uso de operações do tipo comando militar. Outras regiões da Bélgica, como Shaerbeek e Anderlecht estão na mesma situação de Molenbeek.
As autoridades belgas deixaram a situação se deteriorar. É como se a situação no país já fosse de uma rendição.
Parece que as autoridades tinham a esperança de que a cegueira deliberada e a aceitação do inaceitável fariam com que o país fosse poupado. Não foi o que aconteceu.
O ataque ao Museu Judaico da Bélgica em 24 de maio de 2014 deveria ter servido de alerta. Não foi o que aconteceu. O fato dos alvos terem sido "apenas" judeus, levou o governo belga a subestimar a ameaça. O jihadista que queria matar passageiros em um trem que ia de Amsterdã a Paris, em 21 de agosto de 2015, preparou os ataques em Bruxelas. O fato dele ter sido neutralizado por três heróis americanos antes de recomeçar o tiroteio convenceu o governo belga de que o perigo não era grande.
Os jihadistas que atacaram Paris em 13 de novembro de 2015 também organizaram os ataques em Molenbeek, o sangue, contudo, não foi derramado na Bélgica. Talvez as autoridades belgas supusessem que a Bélgica seria poupada. Elas falavam de um "perigo iminente" por um dia, ou coisa do gênero, mas nunca reforçaram a segurança.
Um dos organizadores dos atentados em Paris, Salah Abdeslam, o criminoso terrorista mais procurado da Europa, vivia tranquilamente em Molenbeek durante quatro meses até que a polícia resolveu prendê-lo. A polícia belga sabia exatamente onde ele se encontrava, contudo só tomou providências após o pedido das autoridades francesas. Após a prisão, ele foi tratado como mero contraventor, não como um terrorista jihadista. A polícia não lhe perguntou nada sobre as redes jihadistas com as quais ele operava. Visto que ele foi ferido nas operações da polícia, os policiais que o interrogaram foram instruídos a tratá-lo com delicadeza. Os elementos que concordaram em escondê-lo por tanto tempo não foram considerados suspeitos e não foram indiciados.
Os ataques jihadistas em Bruxelas foram desferidos dois dias depois.
Malgrado terem sido os piores ataques em solo belga desde a Segunda Guerra Mundial, parece que as autoridades belgas não estão preparadas para mudarem de conduta.
Após os ataques, o Primeiro Ministro da Bélgica Charles Michel repudiou os "atos violentos e covardes" e ressaltou sua "determinação", sem dizer o pretendia fazer. Ele não falou da necessidade de mudar as leis belgas para torná-las mais eficientes. Sem dar nome aos bois, ele não citou nenhum inimigo. Ele nunca fez uso de palavras tais como "jihad" ou "Islã radical".
Ele se comportou e conversou como a maioria de seus pares europeus. O Primeiro Ministro da França Manuel Valls usou termos mais ousados salientando diversas vezes que estava combatendo a "jihad radical" e o "islamismo." O parlamento francês aprovou leis ainda impossíveis de serem aprovadas na Bélgica: batidas policiais à noite. A França, no entanto, é a única e, para todos os efeitos a situação da França não é nada melhor do que a da Bélgica. Há bolsões islamistas em muitos subúrbios. Cidades inteiras são controladas por criminosos e imãs radicais: bairros como Roubaix, Trappes, Aubervilliers e Sevran no norte de Paris.
Bolsões islamistas também podem ser encontrados em outros países europeus: Espanha, Holanda, Alemanha, Reino Unido e Suécia.
Os líderes europeus fizeram suas escolhas. Após o término da Segunda Guerra Mundial, eles acharam por bem transformar a Europa em uma região do planeta onde não haveria mais guerras e que todos os problemas seriam solucionados por meio da diplomacia e conciliação. Eles foram abandonando gradualmente as atividades na esfera da defesa e segurança. Optaram por priorizar a edificação de estados de bem estar social. Eles acreditavam que cuidar do povo do berço até o fim da vida eliminaria o ódio e os conflitos. Eles se recusaram a admitir a existência de perigos totalitários e a necessidade de mostrar força. De lá para cá, seus pronunciamentos indicam que os líderes europeus acreditam que tanto o Muro de Berlim quanto o império soviético caíram graças à benevolência de Mikhail Gorbachev e não graças à determinação de Ronald Reagan. De lá para cá, ao que tudo indica, eles acreditam que o Islã é no fundo uma religião da paz e que os jihadistas fazem parte de uma seita minúscula, marginal.
Há décadas os líderes europeus adotaram uma política abrangente de "abertura" em relação ao mundo islâmico em geral e ao mundo árabe em particular. Eles resolveram oferecer cordial acolhimento a migrantes do mundo muçulmano, a centenas de milhares deles, sem contudo solicitar integração. Fizeram do relativismo cultural e do multiculturalismo seu princípio norteador. Agiram como se o Islã pudesse se fundir sem maiores dificuldades, harmoniosamente, com o mundo ocidental. Os líderes europeus disseminaram a ideia de que o Ocidente era culpado pela opressão dos muçulmanos e que portanto tinha que pagar pelos seus pecados. Consequentemente foram eles (europeus) que semearam o ressentimento antiocidental no meio muçulmano da Europa.
Quando no mundo muçulmano os jihadistas começaram com os assassinatos, os líderes europeus queriam acreditar que os ataques se restringiriam apenas aos territórios do mundo muçulmano. Eles estavam convencidos de que se não interviessem nas tramas dos jihadistas europeus não haveria risco de ataques jihadistas em solo europeu.
Quando os judeus foram atacados, os líderes europeus entenderam que o problema não era a jihad e sim Israel. Eles frisaram o imperativo de não "exportar o conflito do Oriente Médio para a Europa". Na esperança de agradar os seguidores do Islã radical e mostrar-lhes que a Europa tinha condições de compreender suas "reivindicações", eles aumentaram a pressão. sobre Israel. Eles também intensificaram o suporte financeiro e político para a "causa palestina".
Quando os europeus foram atacados, eles não conseguiram entender o porquê. Eles tinham dado tudo de si para agradar os muçulmanos. Eles sequer incomodaram os jihadistas. Eles ainda não sabem o que fazer.
Muitos deles já dizem, em caráter confidencial, o que jamais diriam publicamente: parece que já é tarde demais.
Há entre seis e oito milhões de muçulmanos na França e mais de trinta milhões na Europa Ocidental. Centenas de jihadistas estão capacitados e prontos para agir, a qualquer momento, em qualquer lugar. Os serviços de inteligência europeus sabem que eles querem montar "bombas sujas". Levantamentos mostram que dezenas de milhares de muçulmanos que vivem na Europa aprovam os ataques jihadistas em solo europeu. Milhões de muçulmanos que residem na Europa se mantêm em silêncio, se comportam como se não vissem nada e não ouvissem nada, protestam somente quando acreditam que devem defender o Islã.
Os líderes políticos europeus estão cônscios de que qualquer decisão que tomem pode provocar reações no meio muçulmano europeu. O voto muçulmano faz diferença. Distúrbios ocorrem com muita facilidade. Na França, Bélgica e em outros países europeus, os islamistas estão presentes nas forças armadas e na polícia. Enquanto isso as organizações islamistas recrutam e os lobbies islâmicos ganham terreno.
Os governos europeus já são reféns. A mídia européia também é refém.
Na maioria dos países europeus, a "islamofobia" é considerada crime; e qualquer crítica ao Islã pode ser considerada "islamofobia". Aqueles que tentam alertar a Europa, como o parlamentar holandês Geert Wilders, estão sendo processados, neste caso apesar do juiz ser, ao que tudo indica, preconceituoso e os documentos contra Geert Wilders terem sido forjados.
Livros sobre o Islã radical ainda são publicados, contudo, envolvidos em silêncio. Livros glorificando o Islã podem ser encontrados em qualquer livraria. Quando o livro Eurabia de Bat Ye'or foi publicado na Europa, ela foi repudiada e recebeu centenas de ameaças de morte. O livro de Bruce Bawer While Europe Slept, publicado nos EUA, não estava nem disponível na Europa. Dez anos depois, a situação se deteriorou ainda mais.
Os movimentos políticos que expressam irritação e insatisfação estão aumentando. Todos estes movimentos são demonizados pelos detentores do poder político e pela mídia. Eles praticamente não têm chance de serem mais influentes.
Populações estão se consumindo pelo medo, frustração e impotência. Elas querem respostas, mas não conseguem encontrá-las. Poucas horas depois dos ataques em Bruxelas, um homem disse à TV belga que a Europa estava à beira do suicídio.
A Europa aparenta ser uma civilização moribunda. Os governos europeus criaram uma situação que só pode levar a mais ataques, mais massacres e provavelmente desastres inimagináveis. Os líderes europeus continuam reagindo com discursos e meia dúzia de batidas policiais.
Se ao menos um pequeno número de governos europeus decidisse restaurar suas abolidas fronteiras, o que poderia levar anos, a maioria dos líderes europeus iria provavelmente discordar de tal política. Enquanto isso, milhões de novos "migrantes" entrarão na Europa e entre eles estarão muitos jihadistas. Independentemente do caos criado na Alemanha pelos "migrantes" que chegaram em 2015, Angela Merkel afirmou que ela não mudará suas decisões. Nenhum governo europeu ocidental ousou discordar dela, salvo Viktor Orbán da Hungria, uma voz solitária da dissidência.
Em Bruxelas, assim como em Paris antes dela, as pessoas convergiram para os locais onde ocorreram os ataques. Eles trouxeram velas e flores em homenagem às vítimas. Eles entoavam cânticos de pesar. Eles choravam. Não havia gritos de revolta contra a jihad. Membros do governo belga conclamavam o povo belga a se abster de reações violentas, declarando que os muçulmanos são as principais vítimas do terrorismo.
O futuro próximo da Europa acena com mais pessoas trazendo velas e flores, entoando cânticos em homenagem às vítimas. E dois ou três jihadistas serão presos. Entretanto, nenhuma medida será tomada.
Dr. Guy Millière, professor da Universidade de Paris, é autor de 27 livros sobre a França e a Europa.