Em uma série de declarações logo após o massacre de 7 de Outubro cometido pelo Hamas em Israel, o Presidente dos EUA, Joe Biden, afirmou que o Hamas não representa todo o povo palestino. Em entrevista concedida à CBS, Biden ressaltou: "acho que Israel entende que uma parcela significativa do povo palestino não concorda com as ideias do Hamas e do Hisbolá".
A afirmação de Biden foi repetida pelo Secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, que adiantou ao Rei Abdullah da Jordânia e ao Presidente da Autoridade Nacional Palestina, Mahmoud Abbas, que o Hamas não representa o povo palestino. Em uma conversa por telefone com Abbas, Blinken "manifestou o contínuo apoio dos EUA ao povo palestino, enfatizando que os terroristas do Hamas não representam os palestinos ou as suas legítimas aspirações de autodeterminação assim como à dignidade, liberdade, segurança e justiça", de acordo com a leitura do Departamento de Estado.
A assertiva da Administração Biden de que o Hamas é um grupo insignificante de terroristas que não conta com o apoio de muitos palestinos não é só falsa, como também perigosa. Tal assertiva contradiz a realidade, o que prova que o Hamas efetivamente representa uma parcela significativa dos palestinos.
Esta inconveniente realidade se baseia em pesquisas de opinião realizadas pelo Centro Palestino de Opinião Pública (PSR), nos resultados das eleições do Conselho Legislativo Palestino e nos conselhos de estudantes universitários e sindicatos de profissionais. Ela também se baseia em manifestações em massa e comícios em apoio ao Hamas antes e depois da carnificina de 7 de Outubro, na qual os terroristas do Hamas assassinaram mais de 1.400 israelenses e feriram mais de 4.000.
O último levantamento do PSR, publicado no mês passado, mostrou que se as eleições presidenciais fossem realizadas hoje, Ismail Haniyeh, líder do Hamas, obteria 58% dos votos, enquanto Mahmoud Abbas receberia somente 37%. A "luta armada" (terrorismo) do Hamas contra Israel teve o apoio de 58% da população palestina, segundo a sondagem. Pouco mais de um quarto (27%) dos palestinos hoje acreditam que o Hamas é quem mais merece representar e liderar o povo palestino, 24% acreditam que a facção Fatah de Abbas (que governa a Cisjordânia) é a mais merecedora e 44% que ambos são indignos de representação e liderança.
Outra pesquisa de opinião do PSR publicada no último mês de junho, constatou que 66% dos palestinos acreditam que Israel não celebrará o seu 100º aniversário e 51% acreditam que o povo palestino terá condições de "recuperar a Palestina no futuro" (ou seja: destruir Israel). Isto significa que a maioria dos palestinos concorda com o desejo do Hamas de eliminar Israel, conforme consta no estatuto de 1988 do grupo terrorista. A sondagem também mostrou que 71% dos palestinos apóiam a formação de grupos armados para assassinar israelenses.
Nos últimos meses, estudantes filiados ao Hamas venceram eleições em duas importantes universidades palestinas na Cisjordânia. Na Universidade An-Najah, em Nablus, o Bloco Islâmico do Hamas conquistou a maioria de 40 cadeiras no conselho estudantil, ao passo que os leais a Abbas/Fatah garantiram 38 cadeiras. Na Universidade Birzeit, perto de Ramala, a capital de fato dos palestinos, o Bloco Islâmico Wafa, filiado ao Hamas, conquistou 25 cadeiras das 51 do conselho estudantil. No início do corrente ano, uma bancada estudantil do Hamas também conquistou a maioria das cadeiras na Universidade Politécnica da Palestina, em Hebron. De acordo com o Middle East Eye:
"as eleições de Birzeit e An-Najah são consideradas o termômetro da política na Cisjordânia. Os resultados destas eleições são interpretados como reflexo da sociedade palestina como um todo, seu posicionamento em relação à Autoridade Nacional Palestina e às orientações dos eleitores em quaisquer eleições mais amplas que possam ocorrer no futuro. Sem eleições gerais palestinas no horizonte, as pesquisas estudantis são vistas como 'teste para medir a opinião pública'..."
Em 2021, Abbas cancelou as eleições convocadas por ele para a presidência e para o parlamento da Autoridade Nacional Palestina depois dele perceber que sua facção Fatah estava prestes a perder para o Hamas, a exemplo do que aconteceu nas eleições parlamentares de 2006. "A decisão de cancelar as eleições se deu por conta dos substancias temores de todas as facções da Fatah de serem derrotadas pelo Hamas",salientou o Dr. Ido Zelkovitz, chefe do departamento do Middle East Studies do Jezreel Valley Academic College, de Israel.
"As divisões dentro da Fatah e as rivalidades dentro das suas facções se opôs diametralmente à frente unida que o Hamas apresentou antes das eleições programadas. Para evitar o constrangimento, Abbas optou por adiar as eleições, apontando o dedo acusatório em Israel por (supostamente) impedir a votação ao recusar a participação dos residentes de Jerusalém Oriental."
Em 2006, o Hamas obteve uma importante vitória quando os seus representantes venceram a eleição parlamentar. Das 132 cadeiras do Conselho Legislativo Palestino, o Hamas conquistou 76 e a Fatah 43.
Ao contrário de Biden e Blinken, Abbas sabe que o Hamas de fato representa sim muitos palestinos e, ao contrário de Biden e Blinken, Abbas viu as manifestações pró-Hamas na Cisjordânia, incluindo as que tiveram lugar a poucos quilômetros do seu escritório em Ramala, logo após o massacre de israelenses, incluindo mulheres, crianças e idosos em 7 de outubro. Ao contrário de Biden e Blinken, Abbas também viu os inúmeros grupos terroristas filiados ao Hamas que surgiram na Cisjordânia nos últimos dois anos. Estes grupos, como o Batalhão de Jenin e a Cova dos Leões, são responsáveis pelo assassinato e ferimento de dezenas de israelenses desde o início do ano corrente.
Abbas e o seu staff compreendem perfeitamente que o Hamas não é um grupo alienígena que aterrizou vindo de Marte. "O Hamas é parte integrante do povo palestino", ressaltou ele em 2014. A ex-representante da OLP Hanan Ashrawi também reconheceu a importância do Hamas na sociedade palestina:
"o Hamas é parte integrante do povo (palestino) e um dos componentes nacionais e sociais do povo."
Ainda que, segundo Biden e Blinken, o Hamas não represente os palestinos, como eles explicam o fato de centenas de milhares de palestinos terem no ano passado participado no comício do grupo para comemorar o 35º aniversário de sua fundação? Além disso, como eles explicam o fato de centenas de residentes palestinos da Faixa de Gaza terem se juntado aos terroristas do Hamas que atacaram as comunidades israelenses perto da fronteira com a Faixa de Gaza?
Ao afirmar que o Hamas não representa os palestinos, Biden e Blinken apontam que Abbas e a Autoridade Nacional Palestina são os genuínos e legítimos representantes dos palestinos. Vale lembrar ao Presidente dos EUA e ao seu Secretário de Estado que Abbas já está no 18º ano de seu mandato de quatro anos. Abbas foi eleito em 2005 e desde então os palestinos não realizaram eleições presidenciais. Vale ressaltar que a última pesquisa de opinião do PSR mostrou que 78% dos palestinos não botam fé em Abbas e querem que ele renuncie.
A administração Biden apresenta a falsa alegação segundo a qual a maioria dos palestinos se opõe ao Hamas e que a Autoridade Nacional Palestina de Abbas, que recompensa terroristas que assassinam judeus com estipêndios mensais, é um "parceiro da paz" de Israel. Esta é uma total distorção da realidade e não representa a verdade.
Recentemente Abbas lembrou a todos que ele é um antissemita e negador do Holocausto. Discursando em 24 de agosto numa reunião da Fatah em Ramala, Abbas salientou:
"eles dizem que Hitler matou os judeus porque eles eram judeus e que a Europa odiava os judeus porque eles eram judeus. Não é verdade. Foi explicado tim tim por tim tim que os europeus lutaram contra os Judeus devido ao seu papel social, e não por conta de sua religião. Os europeus lutaram contra estas pessoas por conta do seu papel social na sociedade, que tinha a ver com usura, dinheiro e assim por diante."
Quando é que Biden e Blinken compreenderão que não há diferença entre os líderes assassinos do Hamas e de Abbas, o antissemita? É claro que tanto Biden como Blinken estão cientes de que Abbas não condenou as atrocidades cometidas pelo Hamas em 7 de outubro. O silêncio de Abbas é uma estrondosa aprovação do massacre a sangue frio de centenas e centenas de israelenses. Que ninguém se engane: tanto o Hamas como Abbas representam a maioria dos palestinos cujo objectivo é assassinar judeus e destruir Israel.
Bassam Tawil, é árabe muçulmano, radicado no Oriente Médio.