Segundo Harris Samaras, especialista na ZEE de Chipre e presidente do banco internacional de investimento Pytheas, "o East Med Pipeline é da maior importância. Na última reunião trilateral entre Israel, Chipre e Grécia se encontrava o secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, que apoiou o projeto." Foto: Primeiro Ministro de Israel Benjamin Netanyahu recebe em Jerusalém o Presidente de Chipre Nicos Anastasiades, o Primeiro Ministro da Grécia Alexis Tsipras e o Secretário de Estado dos Estados Unidos Mike Pompeo, em março de 2019. (Imagem: Assessoria de Imprensa do Governo de Israel) |
A mais recente provocação da Turquia contra a República de Chipre, a prospecção de gás na Zona Econômica Exclusiva de Chipre (ZEE) no Mediterrâneo Oriental, está dando margem a duras reações da comunidade internacional.
Ao comparar a ingerência da Turquia a "uma segunda invasão", o presidente cipriota Nicos Anastasiades disse que a ação constitui uma "violação ao direito internacional", o Ministério das Relações Exteriores apresentou um mapa delineando as fronteiras da ZEE com a Turquia às Nações Unidas. Além disso, o Ministro das Relações Exteriores de Chipre, Nicos Christodoulides salientou que seu governo está se emprenhando em conseguir um mandado de captura internacional contra a tripulação do "Fatih" a embarcação de prospecção despachada por Ancara para as águas cipriotas.
A Alta Representante e Vice-Presidente da UE, Federica Mogherini, de imediato emitiu um comunicado "apelando com a máxima urgência à Turquia para que aja com contenção, respeite os direitos soberanos de Chipre em sua zona econômica exclusiva e se abstenha de qualquer ação ilegal à qual a União Europeia responderá de forma adequada e em plena solidariedade para com Chipre".
O Departamento de Estado dos EUA também exortou a Turquia a suspender a prospecção.
O Ministério das Relações Exteriores da Turquia não deixou por menos, revidando com um comunicado próprio:
"os esforços de terceiros no sentido de atuarem como um tribunal internacional para delinear as fronteiras marítimas é inaceitável. Neste contexto, a declaração dos EUA chamando a atenção da Turquia para dizer que 'existem reivindicações greco/cipriotas na região' não é construtiva nem compatível com o direito internacional, dado o fato de que não há um acordo válido de delimitação marítima na região."
Em uma entrevista recente ao Gatestone Institute, Harris Samaras, especialista na ZEE de Chipre e presidente do banco internacional de investimento Pytheas, explicou:
"Embora a Turquia esteja violando a soberania de Chipre desde 1974, a atual situação política e econômica interna da Turquia, altamente volátil, fez com que o governo turco se tornasse ainda mais agressivo no Mediterrâneo Oriental. O presidente Recep Tayyip Erdogan e o partido governista da legenda AKP têm que livrar a cara sustentando o dogma do supranacionalismo que concedeu poder a ele e a seu partido."
"Outro fator que precipitou a ação da Turquia foi a confirmação da existência de hidrocarbonetos de valor comercial na ZEE de Chipre e o anunciado interesse de conglomerados de petróleo e gás, como a ExxonMobil, a ENI e a Total, a continuarem suas atividades. No ano passado, a ENI foi obstruída a continuar com as operações por canhoneiras da Turquia. A ExxonMobil não. Por que isso? Porque a ExxonMobil estava acompanhada pela Marinha dos EUA, de modo que a Turquia ficou de mãos atadas."
"Enquanto isso, as descobertas de gás natural pela ExxonMobil demonstraram que Chipre poderia eventualmente montar uma fábrica de liquefação para armazenar as reservas regionais cipriotas. Isto transformaria Chipre quase que automaticamente em um centro regional de hidrocarbonetos e ao mesmo tempo reduziria a importância energética, os planos e os investimentos da Turquia."
"Politicamente, Israel é a maior ameaça regional aos interesses da Turquia. O elo energético mais robusto para Israel é Chipre, um Estado Membro, democrático, da UE. Portanto, para que os planos de Erdogan possam avançar, é preciso eliminar Chipre. Além disso, o Egito é uma força regional significativa que conta dos campos de gás natural de Zhor em seu arsenal. A despeito das diferenças do passado, houve uma melhora no relacionamento entre israelenses e egípcios."
Erdogan está ciente de que será impossível para a Turquia alcançar seus objetivos de hegemonia regional se os interesses dos EUA, em particular, mas também os dos franceses, forem os de implementar uma cabeça-de-ponte sólida em Chipre. Esse é o seu maior temor.
"Fora isso, o relacionamento da Turquia com a Rússia se fortaleceu nos últimos anos. Se a Turquia acabar instalando os S-400 russos, Erdogan sabe muito bem que seu raio de ação e sua influência geopolítica serão limitados das mais diferentes maneiras, visto que entrarão em conflito direto com os interesses dos EUA e de Israel. 'Neutralizar' Chipre, o elo mais fraco da equação, em muitos aspectos, desarma a eficácia geopolítica regional de Israel."
"De modo que o East Med Pipeline, inaugurado com a bênção dos EUA, é da maior importância. Na última reunião trilateral entre Israel, Chipre e Grécia se encontrava o secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, que apoiou o projeto. Se for adiante, ele será um belo tapa na cara nos planos energéticos da Turquia."
Theodoros Tsakiris, professor assistente de política energética e geopolítica na Universidade de Nicósia, ressaltou ao Gatestone Institute:
"A Turquia começou a visar a ZEE de Chipre em 2011, quando assinou um acordo de demarcação da sua plataforma continental com a área ocupada de Chipre pela Turquia, que apenas e tão somente ela própria reconhece como estado independente, a assim chamada 'República Turca de Chipre do Norte' (RTCN). As operações turcas na ZEE de Chipre são ilegais, os navios turcos também estão causando sérias dificuldades às empresas cipriotas e internacionais que operam na região. Em fevereiro de 2018, por exemplo, a marinha turca bloqueou a prospecção da empresa petrolífera italiana ENI dentro da ZEE cipriota demarcada. Concomitantemente, mais navios de prospecção turcos podem estar a caminho."
"É necessário que sejam tomadas medidas concretas para impedir que a Turquia continue com as violações à ZEE de Chipre. Sansões deveriam ser impostas na esfera da Comissão Europeia às pessoas e empresas responsáveis pela prospecção. Todos os fundos a título de pré-adesão à Turquia deveriam ser bloqueados e o acesso turco a empréstimos do Banco Europeu de Investimento deveriam ser eliminados. Outras opções poderiam ser empregadas caso a Turquia agrave ainda mais a situação, como a imposição de sanções ao setor bancário da Turquia e o congelamento total do processo de acessão. Também é necessário que os Estados Unidos suspendam o embargo irracional de armas à República de Chipre imposto em 1987 e a ajude a se rearmar e modernizar sua capacidade de defesa, mantendo simultaneamente a missão de paz da ONU (UNFICYP) intacta."
Uzay Bulut, jornalista da Turquia, Ilustre Colaboradora Sênior do Instituto Gatestone.