7 de outubro de 2023: outro dia que permanecerá na infâmia: o Pearl Harbor de Israel. O 11 de Setembro de Israel. A tranquila manhã do Shabat de Simchat Torá, que conclui a Festa Judaica dos Tabernáculos, de repente virou um banho de sangue. Debaixo de uma enxurrada de foguetes lançados contra Israel, milhares de terroristas do Hamas atacaram as comunidades do sul de Israel deixando um rastro de carnificina e devastação, emboscaram bases militares e motoristas, assassinaram cerca de 364 pessoas que se encontravam num festival de música, massacraram famílias em suas camas, estupraram mulheres, assassinaram crianças e sobreviventes do Holocausto, civis foram queimados vivos, raptaram 244 pessoas em Israel e as levaram para Gaza. Com pelo menos 1.200 pessoas assassinadas, foi o dia mais letal para os judeus desde o Holocausto. A barbárie do ataque sem precedentes do Hamas atingiu um grau tal que até o mundo, ainda que brevemente, foi brutalmente sacudido da sua habitual apatia, ficou pasmo e atordoado pela monstruosidade.
A consternação, no entanto, durou pouco. Assim que Israel iniciou a resposta militar ao ato de guerra do Hamas, manifestações pró-palestina eclodiram mundo afora, muitas das quais logo viraram festivais de ódio anti-Israel e antijudaico. Alguns até negaram que o massacre de 7 de Outubro sequer tivesse ocorrido, apesar dos inúmeros relatos de testemunhas oculares de sobreviventes.
Algumas reações de católicos ao massacre e à guerra que se seguiram foram contraditórias, indo desde uma corajosa clareza moral a uma questionável ambiguidade moral até a um desconcertante silêncio. Embora alguns tenham apoiado o direito de Israel se defender, outros optaram pela neutralidade, julgando ser uma postura mais benevolente e "cristã" não tomar partido e condenar igualmente a perda de vidas de ambos os lados. Essa postura de equivalência moral sugere que ambas as partes do conflito têm a mesma culpa e a mesma responsabilidade moral pelas consequências de suas ações. Intelectualmente, este é um caminho fácil. Mas ele é moralmente correto?
Um grupo que recorre consistentemente à equivalência moral são os Patriarcas e Líderes das Igrejas de Jerusalém. Uma rápida análise das reações deles à crise, juntamente com as respostas da Embaixada de Israel junto a Santa Sé, ilustram os problemas desta posição.
Na manhã de 7 de outubro, enquanto o massacre do Hamas ainda estava em andamento, o Patriarcado Latino de Jerusalém imediatamente divulgou um comunicado repleto de equivalência moral. Em vez de condenar inequivocamente o massacre, o Patriarcado afirmou que "o ciclo de violência que matou inúmeros palestinos e israelenses nos últimos meses explodiu esta manhã". A declaração continua com a vaga linguagem de "explosão súbita de violência", induzindo a erro, como se ambos os lados, "a operação lançada a partir de Gaza e a reação do exército israelense", fossem igualmente culpados. As "inúmeras vítimas e tragédias" que afligem "tanto as famílias palestinas como as israelenses", continua a declaração, "criariam mais ódio e divisão" e "destruiriam mais e mais qualquer perspectiva de estabilidade".
Naquela mesma tarde, a Embaixada de Israel na Santa Sé divulgou um comunicado inicial de que, embora não dirigido diretamente ao Patriarcado, soou como uma resposta a ele. A Embaixada alertou que, dada a extensão do massacre ainda em curso do Hamas, "o uso de ambiguidade linguística e de termos que sugerem uma falsa simetria deveria ser deplorado". A resposta de Israel ao "hediondo crime de guerra" do Hamas foi legítima defesa, e "traçar paralelos onde eles não existem não é pragmatismo diplomático, é simplesmente errado".
Os Patriarcas e Líderes das Igrejas de Jerusalém não deram a mão à palmatória. No dia seguinte, eles emitiram um "comunicado sobre paz e justiça em meio à crescente violência" que era igualmente moralmente ambíguo. O segundo comunicado não mencionava nada sobre os assassinatos cometidos pelo Hamas. Ele lamentava em termos mais genéricos que a Terra Santa estava "atualmente atolada na violência e no sofrimento devido ao prolongado conflito político e à lamentável ausência de justiça e de respeito dos direitos humanos".
Embora os Patriarcas e Líderes das Igrejas tenham afirmado que "condenam inequivocamente quaisquer atos que visem civis", eles sugerem essencialmente que Israel não deveria se preocupar demasiadamente com os seus milhares de mortos, feridos, estuprados e raptados, pedem em contrapartida "a cessação de todos os ataques violentos e atividades militares que prejudiquem tanto civis palestinos quanto israelenses." Em outras palavras, Israel deveria pagar o pato dos bárbaros ataques e literalmente deixar o Hamas se safar impune, com a imediata interrupção da sua resposta militar. Não interessa o fato do Hamas ter iniciado brutal e unilateralmente a guerra, invadido Israel e cometido crimes sem precedentes contra uma população civil inocente.
Em 9 de outubro, a Embaixada de Israel na Santa Sé respondeu. Ela novamente lamentou a "imoralidade de usar a ambiguidade linguística" dada a extensão do massacre, pois ficou claro que famílias inteiras foram "executadas a sangue frio" pelo Hamas e pela Jihad Islâmica. Enquanto muitos mundo afora tenham tido a integridade de condenar "o crime hediondo, dar o nome aos bois, os perpetradores, e reconhecer o direito fundamental de Israel de se defender contra a atrocidade", os Patriarcas e Líderes das Igrejas não tiveram a coragem de tal clareza moral. A Embaixada de Israel considerou a declaração deles "extremamente decepcionante e frustrante" porque ela demonstrou precisamente a "imoral ambiguidade linguística" que obscureceu as linhas em relação ao "o que aconteceu, quem foram os agressores e quem foram as vítimas". A Embaixada acrescentou que era "para lá de inacreditável que um documento tão estéril tenha sido assinado por pessoas de fé".
Em 11 de outubro, o Papa Francisco ressaltou com ligeira franqueza que é "o direito daqueles que são atacados de se defenderem", enfatizando ao mesmo tempo que ele estava "muito preocupado com o cerco total em que vivem os palestinos em Gaza, onde também houve muitas vítimas inocentes".
Mas os Patriarcas e Líderes das Igrejas não se deram por vencidos e bateram o pé com mais força ainda quanto à equivalência moral e em 12 de outubro divulgaram um "comunicado sobre a escalada da crise humanitária em Gaza." Neste novo comunicado, eles lamentaram que a sua "amada Terra Santa" tenha "mudado dramaticamente" por conta de um "novo ciclo de violência por um ataque injustificável contra todos os civis." Os líderes, no entanto, deploraram, em especial, a "morte e destruição em Gaza " e a "desastrosa catástrofe humanitária", que atribuíram ao fato da população de Gaza ser "privada de energia elétrica, água, abastecimento de combustível, alimentos e medicamentos". Mais uma vez, os líderes da Igreja apelaram para uma desescalada da guerra.
Raphael Schutz, Embaixador de Israel na Santa Sé, classificou a declaração de "perturbadora" e respondeu detalhadamente com a revisão dos acontecimentos. Ele lembrou aos líderes da Igreja que:
"O que realmente aconteceu foi que o "ciclo da violência" (típica expressão da falsa simetria) começou com um ataque criminoso, não provocado, cometido pelo Hamas juntamente com a Jihad Islâmica (os patriarcas se recusam a mencionar os seus nomes) quando assassinaram mais de 1300 israelenses e também de outras 35 nacionalidades, na maioria civis. Eles também estupraram mulheres, atearam fogo em bebês, decapitaram pessoas e fizeram reféns. Simultaneamente, eles lançaram ataques com mísseis e foguetes de amplo alcance contra centros da população civil em Israel, cidades, povoados, aldeias, kibutzim".
O Embaixador ressaltou que "a ação de autodefesa de Israel visa o Hamas e a Jihad Islâmica. Israel não alveja civis intencionalmente."
É de conhecimento geral que as IDF lançam alertas aos civis palestinos por meio de panfletos, mensagens de texto e até telefonemas para que evacuem as áreas próximas aos alvos militares antes de serem atacados. Ao passo que as IDF, sem medir esforços, procuram minimizar o número de vítimas civis, o Hamas e outros grupos terroristas palestinos fazem de tudo para maximizar o número de vítimas civis, não só assassinando indiscriminadamente os israelenses, mas também se escondendo entre a sua própria população civil, usando-a como escudos humanos, resultando num número desproporcionalmente elevado de vítimas palestinas, causadas deliberadamente pelo Hamas. Sob esta ótica, continuou o embaixador israelense, a declaração dos patriarcas só poderia ser vista como "injusta, tendenciosa e arbitrária".
Quanto à "morte e destruição em Gaza", os patriarcas ao que tudo indica, esqueceram que "Gaza é a base a partir da qual o ataque genocida contra Israel foi concebido, planejado e executado". Quem, então, é responsável pela "morte e destruição"? O embaixador questionou porque é que os patriarcas estão tão preocupados com o "bem-estar deste ninho do mal e do terror", e não com as devastadas comunidades israelenses.
Realmente, de acordo com as últimas pesquisas de opinião, a maioria da população palestina apoia a "luta armada" (terrorismo) do Hamas contra Israel e a formação de grupos armados para assassinar israelenses, uma triste realidade que lança dúvidas sobre a inocência dos "palestinos comuns" de Gaza.
Em relação à situação humanitária, o embaixador respondeu:
"os níveis de alimentos e água são monitorizados diariamente e estão acima do limiar que define a 'crise humanitária'. Também há quantidade suficiente de combustível e energia elétrica nas mãos do Hamas, mas eles preferem usá-los para continuar com as suas atividades criminosas terroristas contra Israel, em vez de ajudar nas necessidades da população que eles dominam."
A bem da verdade ainda há bastante água, alimentos, combustível e medicamentos em Gaza.
Ao fim e ao cabo, o embaixador israelense observou que os patriarcas chamaram única e exclusivamente um lado pelo nome, Israel, fazendo exigências desarrazoadas à "parte que foi violentamente atacada". O Hamas nunca é mencionado e dá a impressão que os palestinos não fizeram nada de errado. Ele concluiu: "que vergonha, principalmente vindo do povo de Deus".
Os esforços de Schutz, lamentavelmente, mais uma vez não deram em nada. Em 24 de outubro, o Patriarca Latino de Jerusalém, Cardeal Pierbattista Pizzaballa, divulgou uma "Carta à toda a diocese". Ele fez por merecer o mérito de ter brevemente afirmado (embora sem dar nome aos autores) que "o que aconteceu em 7 de outubro no Sul de Israel é inadmissível e não há como não condenar o ocorrido. Não há razão para tal atrocidade."
No entanto, Pizzaballa não mediu esforços para condenar a perda de vidas e as privações que "este novo ciclo de violência trouxe a Gaza", acrescentando que a "continuação dos pesados bombardeios" em Gaza "só causarão mais mortes e destruição e só aumentarão o ódio e o ressentimento." Para o patriarca, "só o fim de décadas de ocupação e suas trágicas consequências, bem como uma perspectiva nacional clara e segura ao povo palestino, poderão abrir caminho para um sério processo de paz".
Então, precisa mais?: Para o patriarca, a raiz do conflito não é o massacre indiscriminado de centenas de famílias pelo Hamas, incluindo mulheres, crianças e idosos, e sim a "ocupação".
Deixando de lado a flagrante farsa destas declarações, não podemos deixar de perguntar: que solução exatamente os patriarcas e chefes de Igreja têm em mente? As declarações deles levantam várias questões.
Primeira, se o problema é a "ocupação", quem ocupa Gaza nos últimos 18 anos?
Em2005, Israel evacuou unilateralmente todos os colonos judeus da Faixa de Gaza, entregando o território, total e incondicionalmente, aos palestinos, na esperança de que, ao governarem a si próprios, eles poderiam finalmente procurar viver em paz com os seus vizinhos. Vários milionários americanos chegaram a comprar 3 mil estufas por US$14 milhões e as entregaram aos habitantes de Gaza para lhes oferecer uma ajuda à nova vida na construção de uma "Cingapura no Mediterrâneo." Em poucos dias, as estufas foram saqueadas e destruídas.
Os palestinos, infelizmente para eles mesmos e para todos os outros, elegeram o Hamas nas eleições legislativas de 2006. Em Junho de 2007 após uma sangrenta guerra civil com o partido rival palestino Fatah, o Hamas passou a controlar totalmente a Faixa de Gaza. Desde então, os civis israelenses no sul de Israel, bem como os palestinos em Gaza, vivem aterrorizados. Um vídeo recente mostra uma mulher de Gaza dizendo: "aqueles bastardos do Hamas", antes de um homem rapidamente tapar a boca dela com a mão. Entretanto, Israel, que a grosso modo é do tamanho de Nova Jersey (22 mil quilômetros quadrados), tem sido alvo, ano após ano, de dezenas de milhares de ataques letais de foguetes lançados a partir da Faixa de Gaza. Se há um problema de "ocupação" em Gaza, quem ocupa é o Hamas, não Israel.
Segundo, o que Israel deveria fazer? Esquecer os mais de 1.200 mortos, mais de 4.800 feridos e 240 sequestrados, aceitar um cessar-fogo imediato e bola pra frente, ou seja: se preparar para os próximos ataques do Hamas? Sentar à mesa de negociações e conversar com um inimigo jihadista que te jurou de aniquilação? Ou quem sabe abrir a fronteira de Gaza, dar aos palestinos a liberdade de entrar e sair de Israel quando quiserem, para que possam consumar seus declarados planos de repetir os ataques de 7 de outubro?
Terceiro, por que os Patriarcas e Líderes das Igrejas se fixam na "ocupação" enquanto ignoram consistentemente a terrível incitação à violência que permeia a sociedade palestina, onde as crianças são ensinadas desde a mais tenra idade a odiar e a matar judeus e os terroristas que odeiam e matam judeus são glorificados e elogiados como "mártires"?
Os Patriarcas e Líderes das Igrejas poderão responder que não podem condenar abertamente o Hamas e outros grupos jihadistas palestinos porque tal condenação colocaria em perigo os cristãos palestinos que vivem entre eles. Justo. Mas isto não pode ser uma desculpa para perverter a narrativa do conflito por meio da questionável equivalência moral, ou pior, culpar Israel como o principal culpado. As declarações destes líderes têm peso. Eles influenciam outros.
Os Patriarcas e Líderes das Igrejas não exerceram a liderança moral, nem apresentaram clareza moral na resposta ao terror do Hamas, não foi só agora, e sim ano após ano, à medida que os foguetes têm incessantemente visado civis israelenses. Embora possa parecer mais conveniente hoje abraçar a neutralidade, estes líderes propagam falsas narrativas e induzem outros a acreditar nelas.
Embora os líderes da Igreja e outros em Israel devam pesar cuidadosamente as suas declarações devido à situação precária dos cristãos palestinos, os de outros países não têm essa desculpa. Em última análise, adotar uma postura de equivalência moral em relação ao conflito Israel/Hamas não é só preguiça intelectual, é imoral. Ao passo que as perdas palestinas sejam trágicas, são consequência inevitável da sua escolha de eleger e manter no poder um grupo terrorista genocida, juramentado de travar uma guerra perpétua contra Israel.
Vale a pena lembrar as palavras do sobrevivente do Holocausto Elie Wiesel:
"sempre temos que escolher um lado. Neutralidade ajuda o opressor, nunca a vítima. O silêncio encoraja o torturador, não o atormentado."
Nesta guerra, os cristãos, e todos nós, temos a responsabilidade moral de apoiar a luta de uma nação civilizada contra a barbárie. Israel precisa erradicar um grupo terrorista, o Hamas, tal como confrontamos o ISIS. Portanto todos nós precisamos conter o verdadeiro cérebro por detrás de tais grupos, o regime genocida do Irã. Infelizmente, não há outra solução viável se quisermos preservar o Ocidente.
André Villeneuve é professor adjunto associado do Old Testament and Biblical Languages no Sacred Heart Major Seminary em Detroit, Michigan. Ele é o autor de "Divine Marriage from Eden to the End of Days" (2021), e fundador e diretor dos Católicos por Israel.