Na Nigéria, nos últimos 20 anos, 100 mil cristãos foram mortos. A Nigéria está se tornando o "maior solo de chacinas de cristãos do planeta. Em 2018 o presidente dos EUA, Donald Trump, levantou a questão com o presidente nigeriano, Muhammadu Buhari. "Estamos diante de gravíssimos problemas quanto aos cristãos que estão sendo assassinados na Nigéria", ressaltou Donald Trump. O presidente americano, no entanto, está praticamente sozinho entre os líderes ocidentais em levantar a questão. Quando seu antecessor, presidente Barack Obama, se encontrou com Buhari, sequer tocou na questão dos assassinatos de cristãos. Foto: Trump e Buhari em 30 de abril de 2018, em Washington, DC. (Foto: Win McNamee/Getty Images) |
"Parem com os assassinatos", "Basta!", "Nossas vidas são importantes", dizem cristãos e líderes religiosos nigerianos aglomerados em Londres em 20 de agosto para protestar contra o massacre de cristãos em seu país. Eles enviaram uma carta ao primeiro-ministro britânico Boris Johnson acusando a mídia internacional de engendrar "a conspiração de silêncio".
Ao mesmo tempo, um relatório de três organizações: Organização Internacional para a Construção da Paz e Justiça Social, Comitê Internacional da Nigéria e o Grupo Parlamentar de Todos os Partidos para a Liberdade Religiosa Internacional ou Crença, divulgaram que nos últimos 20 anos, 100 mil cristãos foram mortos na Nigéria. O Boko Haram, Al Qaeda, pastores Fulani e outros grupos islamistas são os responsáveis pela morte de mais de 96 mil cristãos em 21 mil ataques. De acordo com o relatório, 43.242 cristãos foram mortos pelo Boko Haram, Estado Islâmico e Al Qaeda, 18.834 morreram em ataques perpetrados pelos Fulani e 34.233 por outros grupos armados. A Nigéria está se tornando o "maior solo de chacinas de cristãos do planeta".
"Essa coisa é sistemática," salientou o arcebispo anglicano Benjamin Argak Kwashi de Jos, "é tudo planejado, tudo calculado... a intenção é islamizar a Nigéria".
As apostas são além de gigantescas, também estratégicas. A Nigéria, que já é o país mais populoso da África, poderá atingir uma população de cerca de 800 milhões de habitantes no ano 2100, de acordo com um estudo conduzido pela revista The Lancet e poderá se tornar a nona maior economia do mundo. "Se o Islã se apoderar da Nigéria, o restante da África poderá facilmente cair em suas mãos", assinalou o Bispo Hyacinth Egbebo.
Quando se lê os relatos sobre os massacres de cristãos nigerianos, o cenário é sempre o mesmo: um vilarejo com alguns casebres, em volta campos abertos. Os jihadistas aparecem na calada da noite e atacam os casebres um a um. Eles arrombam portas, gritam "Allahu akbar", assassinam idosos, estupram e mutilam mulheres e crianças e sequestram para exigir resgate como "negócio". Eles incendeiam moradias, escolas e igrejas." É como se a vida dos cristãos não tivesse mais nenhuma importância", salientou o Pastor Stephen Baba Panya, presidente da Igreja Evangélica Winning All.
"Nos cinturões norte e central da Nigéria, milhares de civis foram assassinados em ataques liderados pelo Boko Haram, pastores islamistas Fulani e outras milícias extremistas", escreveu a Baronesa Caroline Cox. "Centenas de igrejas foram reduzidas a cinzas. Comunidades inteiras foram forçadas a abandonar seus lares e terras cultivadas". A Sociedade Internacional para as Liberdades Civis e o Estado de Direito alertou para o risco de "Genocídio estilo Ruanda"
As organizações que monitoram a perseguição aos cristãos há muito tempo vêm tecendo duras críticas pelo que está acontecendo. Em 2012, a Open Doors USA já apontava para o risco de genocídio na Nigéria. Oito anos mais tarde, quantas vidas cristãs foram ceifadas? Quantas poderiam ter sido salvas, se a mídia, as chancelarias e as organizações internacionais tivessem pressionado a liderança nigeriana para proteger os cristãos do país? Por que o Ocidente nunca atrelou o comércio, o intercâmbio diplomático, militar e político com a Nigéria à proteção dos cristãos?
O presidente dos EUA, Ronald Reagan, atrelou as negociações com a União Soviética a uma campanha para deixar que os judeus da Rússia saíssem do país. Ainda que os judeus da União Soviética não estivessem sofrendo as atrocidades que os cristãos da Nigéria sofrem todo santo dia.
Em 2018 o presidente dos EUA, Donald Trump, levantou a questão com o presidente nigeriano, Muhammadu Buhari. "Estamos diante de gravíssimos problemas quanto aos cristãos que estão sendo assassinados na Nigéria", ressaltou Donald Trump. O presidente americano, no entanto, está praticamente sozinho entre os líderes ocidentais em levantar a questão. Quando seu antecessor, presidente Barack Obama, se encontrou com Buhari, nunca tocou na questão dos assassinatos de cristãos.
O presidente Donald Trump deveria "nomear um enviado especial para a Nigéria e para a região do Lago Chade para 'focar como um raio laser' nos ataques do Boko Haram e dos demais militantes islâmicos... para dar um basta no genocídio de cristãos na região", urgiu o ex-congressista Frank Wolf.
Há seis anos, o sequestro de 276 estudantes do sexo feminino, em sua maioria cristãs, pelo grupo islamista Boko Haram em Chibok, Nigéria, levou à condenação internacional. A hashtag #BringBackOurGirls viralizou no Twitter, não é de se estranhar que não teve efeito em Buhari. A campanha da hashtag foi breve.
Somente uma das adolescentes nigerianas sequestradas, Leah Sharibu, não conseguiu a liberdade, tendo que passar dois anos no cativeiro do Boko Haram. Por que isso? Porque ela se recusou a renunciar ao cristianismo e se converter para o Islã. A mãe dela participou de uma manifestação em Londres, mas nenhum jornal de peso europeu se deu ao trabalho de abrir um espaço para o caso dela. "Por cansaço ou vergonha ou as duas coisas, fizemos vista grossa", salientou o jornalista Franz-Olivier Giesbert.
"Será que a vida dos cristãos do Oriente, África ou Ásia valem alguma coisa? Esta é pergunta que não quer calar e que temos o direito de fazer a nós mesmos ao vermos o espaço que os nossos queridos meios de comunicação dão aos assassinatos e discriminações que católicos e protestantes são alvo no planeta: nada ou quase nada, somente raras exceções que tiveram sorte (...) É a nossa tartuferie (hipocrisia) que alimenta o choque de civilizações".
Outra exceção foi o autor francês Bernard-Henri Lévy. Em um longo artigo, Lévy descreveu sua visita a igrejas e vilarejos nigerianos incendiados e reduzidos a escombros por fundamentalistas islâmicos, enquanto padres e bispos locais lhe mostravam fotos de mulheres cristãs mutiladas por terem se recusado a se converter ao Islã. Mais tarde um Fulani lhe disse o seguinte:
"esta é a nossa terra, há cristãos demais aqui, os cristãos são cães e filhos da puta. Eles são traidores porque se converteram à religião branca. Quando todos partirem, a Nigéria finalmente será livre".
A jornalista americana Kirsten Powers escreveu:
"cristãos no Oriente Médio e na África estão sendo massacrados, torturados, estuprados, sequestrados, decapitados e forçados a fugir do local de nascimento do cristianismo. É de se imaginar que esse horror estivesse arrasando os púlpitos e bancos das igrejas americanas. Mas não. O silêncio tem sido ensurdecedor."
As principais igrejas dos EUA vêm abraçando a "sinalização de virtude" em relação ao racismo depois da morte de George Floyd, mas nenhum líder cristão disse "a vida dos cristãos negros importa" para sensibilizar a conscientização com respeito ao massacre de cristãos. Conforme salientou um bispo, o silêncio do Ocidente sobre a perseguição aos cristãos tem sido "sinistro"
O "genocídio cultural" dos uigures pelo regime chinês vem sendo duramente criticado e se encontra no radar com firmeza e convicção na nossa mídia e o "Genocídio de Rohingya" em Mianmar acabou no Tribunal Internacional de Justiça em Haia, os parlamentares alemães e União Europeia o condenaram. No entanto, quanto ao genocídio de 100 mil cristãos no maior país da África, o Ocidente simplesmente deu de ombros.
Giulio Meotti, Editor Cultural do diário Il Foglio, é jornalista e escritor italiano.