O escritor saudita Mohammed al-Shaikh defendeu a proibição dos palestinos de participarem da peregrinação islâmica do haj para Meca, depois que apareceu um vídeo mostrando palestinos, no último haj, com bandeiras palestinas entoando, "com sangue, com a alma, nós a recuperaremos, Mesquita de Al-Aqsa!" A Arábia Saudita tem leis rigorosíssimas que proíbem qualquer atividade política durante o haj. Foto: Haj peregrinos dentro e ao redor da Grande Mesquita de Meca e também no piso superior durante as rezas noturnas. (Imagem: Al Jazeera/Wikimedia Commons) |
Será que é verdade? Se for, por que então? Lamentavelmente, os palestinos têm a fama de trair seus irmãos árabes, até de apunhalá-los pelas costas. Senão vejamos: os palestinos apoiaram Saddam Hussein quando da invasão do Kuwait pelo Iraque em 1990, um país do Golfo que, juntamente com seus vizinhos, doava todos os anos dezenas de milhões de dólares aos palestinos a título de ajuda.
É exatamente por conta dessa deslealdade que um número cada vez maior de árabes, particularmente os que vivem nos países do Golfo, vêm alimentando a fama dos palestinos nos últimos anos.
No entanto, de uns meses para cá, a visão negativa que os árabes têm em relação aos palestinos, ventilada na maioria das vezes através da mídia tradicional e das redes sociais, agrava ainda mais a situação, tornando-a por vezes apelativa.
Alguns escritores e jornalistas árabes expressaram indignação diante da oposição dos palestinos aos planos de paz, particularmente ao "Acordo do Século" a ser divulgado pela administração americana.
Eles acusam os palestinos de terem deixado escapar um sem-número de oportunidades, salientando que o "Acordo do Século" poderia bem ser a "última chance dos palestinos de estabelecerem um estado."
O saudita Khalid Ashaerah, acusou os palestinos de "traidores" ressaltando esperar que Israel seja "vitorioso" em cima dos palestinos.
Os ataques dos árabes contra os palestinos refletem uma intensa e crescente desilusão no mundo árabe no que tange os palestinos e a qualquer coisa que tenha a ver com eles.
No âmago desse profundo sentimento de desilusão se encontra a convicção dos árabes segundo a qual, apesar de tudo que fizeram para ajudar seus irmãos palestinos nas últimas sete décadas, os palestinos provaram ser invariavelmente mal-agradecidos para com os povos e países árabes e muçulmanos.
Tamanho alastramento da concepção ora sendo expressada em vários países árabes, imputa aos palestinos a traição a seus irmãos árabes e muçulmanos. Conforme um ditado árabe, essa visão os acusa de cuspirem no prato que comeram. A representação se refere à ajuda financeira que os palestinos vêm recebendo de muitos países árabes, por décadas a fio.
Até há poucos anos, eram os egípcios que encabeçavam a campanha antipalestina no mundo árabe. Proeminentes personalidades da mídia, jornalistas, escritores e políticos egípcios pareciam competir uns com os outros pelo galardão para quem atacasse os palestinos com mais rigor.
Os egípcios dirigem suas críticas contra o grupo terrorista palestino Hamas que controla a Faixa de Gaza, um enclave costeiro que faz fronteira com o Egito. Os críticos egípcios, cuja maioria é cupincha do regime do presidente egípcio Abdel Fattah el-Sisi, veem o Hamas, braço da organização Irmandade Muçulmana, ora proscrita no Egito, como ameaça à estabilidade e à segurança nacional do Egito.
Esses críticos também parecem estar loucos da vida com as desmensuradas críticas dos palestinos ao presidente Sisi por este ter, ao que consta, boas relações com Israel e com a administração americana.
Ao que tudo indica, os palestinos acreditam que Sisi conspira contra eles em conluio com Israel e com a administração americana. Por exemplo: eles destacam que em maio deste ano o primeiro-ministro de Israel Benjamin Netanyahu chamou Sisi de "meu amigo." Netanyahu havia agradecido a Sisi por ele ter enviado dois helicópteros para combater incêndios florestais em Israel. "Eu sou grato ao meu amigo, o presidente egípcio Sisi, por ele ter enviado os dois helicópteros," salientou Netanyahu.
"Em vez de defenderem a causa deles, os palestinos preferem insultar Sisi e o povo egípcio," ressaltou o consagrado jornalista egípcio Azmi Mujahed.
"Eu tenho um recado para os mendigos palestinos que venderam suas terras e sua honra: Vocês estão xingando o Egito, suas forças armadas e o presidente. Vocês são um bando de gente execrável. Quem insulta nosso presidente insulta a nós todos."
Os ataques dos egípcios contra os palestinos atingiu o auge em 2014, quando inúmeros escritores e jornalistas consagrados exortaram o governo e expulsar os palestinos e lançar um ataque militar contra a Faixa de Gaza. As duras críticas vieram em meio a relatos que os dirigentes do Hamas da Faixa de Gaza estavam fornecendo suporte a grupos terroristas inspirados no ISIS, que estavam guerreando contra as forças de segurança egípcias bem na Península do Sinai.
A escritora egípcia Lamis Jaber exortou o governo egípcio a expulsar do país todos os palestinos e confiscar seus bens. Além disso, pediu a prisão de todo aquele que simpatizasse com os palestinos. "Nós fornecemos ajuda à Faixa de Gaza e como forma de agradecimento eles (palestinos) assassinam nossas crianças. São cachorros e traidores."
Jaber ainda destacou que enquanto palestinos enfermos são tratados gratuitamente em hospitais egípcios, os dirigentes do Hamas estão aproveitando a vida, se divertindo em "hotéis cinco estrelas" na Turquia e no Catar.
Jaber é apenas uma de inúmeras egípcias e egípcios de destaque em campanha contra os palestinos nos últimos anos, movimento que reflete o descontentamento árabe em relação à "ingratidão" e à "arrogância" dos palestinos
O recado que os egípcios estão mandando aos palestinos é o seguinte: estamos fartos de vocês, da sua incapacidade de tomar jeito, já está mais do que na hora de vocês se comportarem como adultos. Também estamos fartos de vocês porque, após termos dado apoio a vocês e lutado pela sua causa todos esses anos, ao fim e ao cabo, vocês cospem em nossa cara e ofendem nosso presidente.
Agora parece que chegou a vez dos sauditas "serem francos, doa a quem doer" em relação aos palestinos. Assim como seus colegas egípcios, muitos escritores, blogueiros, ativistas e jornalistas sauditas se voltaram para as redes sociais para condenar os palestinos de uma maneira jamais vista. Há sauditas por exemplo, que pintam os palestinos como terroristas e os acusam de vender suas terras aos israelenses.
Essas duras críticas não são manifestadas somente pelos sauditas, mas por um número crescente de árabes de outros países árabes e muçulmanos, particularmente no Golfo.
Na mesma linha dos egípcios, os sauditas também estão furiosos com os recorrentes ataques dos palestinos dirigidos à família real da Arábia Saudita, em especial contra o príncipe herdeiro Mohammed bin Salman. Nos últimos dois anos os palestinos queimaram bandeiras sauditas e fotos de bin Salman durante manifestações na Cisjordânia e na Faixa de Gaza. Por que? Os palestinos acham que o príncipe herdeiro é íntimo demais de Israel e da administração americana.
Assim como os egípcios, os sauditas se sentem traídos pelos palestinos. Por anos a fio a Arábia Saudita doou bilhões de dólares aos palestinos a título da ajuda financeira, mas isso de nada adiantou. Eles não deixam passar nenhuma oportunidade de falar mal dos dirigentes sauditas.
Os sauditas também já estão dizendo que estão cheios disso tudo. A indignação deles atingiu o auge em junho passado, quando os palestinos atacaram um blogueiro saudita que visitava o Complexo da Mesquita de Al-Aqsa na Cidade Velha de Jerusalém. Os palestinos cuspiram na cara do blogueiro, Mohammed Saud, acusando-o de promover a "normalização" com Israel ao visitar o país.
De lá para cá muitos sauditas e cidadãos dos países do Golfo vêm atacando diariamente os palestinos, na maioria das vezes nas redes sociais.
O blogueiro saudita Mohammed al-Qahtani ressaltou:
"A todos aqueles que nos ouvem: solicitamos a transferência da custódia da Mesquita de Al-Aqsa da Jordânia para o Estado de Israel para que o execrável ataque contra o cidadão saudita Mohammed Saud não se repita."
Essa inusitada declaração vinda de um escritor saudita seria totalmente inimaginável poucos anos atrás. Um cidadão saudita dizer que prefere que a custódia de um lugar sagrado islâmico esteja nas mãos de Israel (do que nas da Jordânia), porque só assim os muçulmanos se sentirão seguros para visitar a mesquita.
Já outros cidadãos sauditas estão extremamente desgostosos devido às relações dos palestinos com o Irã. O Hamas e a Jihad Islâmica, os dois grupos terroristas que controlam a Faixa de Gaza, recebem ajuda financeira e militar do Irã e apoio político da Turquia. Os sauditas e outros países do Golfo veem o Irã, não Israel, como a maior ameaça à estabilidade de seus países. Por conta disso, eles se aproximaram de Israel nos últimos anos. Tanto Israel quanto esses países têm um inimigo em comum: o Irã.
Surpreendentemente, o escritor saudita Turki al-Hamad, fez o que muitos líderes ocidentais se recusam a fazer: ele ousou censurar o Hamas e demais grupos de Gaza por lançarem foguetes contra Israel. Al-Hamad fez duras críticas aos palestinos por deixarem que o Irã e a Turquia os façam de fantoches. Ao tecer comentários sobre uma recente rajada de mísseis lançada da Faixa de Gaza contra Israel, ele ressaltou: "o Irã e a Turquia enfrentam uma crise (aparente referência à crise econômica e política que passam ambos os países) e os palestinos é que estão pagando o pato." Em outras palavras, os palestinos optaram por se alinhar a dois países, Irã e Turquia, que apoiam a Irmandade Muçulmana e demais grupos extremistas como o Hamas, Jihad Islâmica e Hisbolá.
Mohammed al-Shaikh, outro escritor saudita repetiu a nova/velha ladainha do mundo árabe, segundo a qual onde quer que os palestinos vão, eles criam problemas.
"Os palestinos trazem infortúnio a qualquer um que os acolha. A Jordânia os acolheu, os jordanianos tiveram o Setembro Negro. O Líbano os acolheu, os libaneses tiveram a guerra civil. O Kuwait os acolheu, os palestinos viraram soldados de Saddam Hussein. Agora estão usando os palanques para nos xingarem."
Em outro comentário postado no Twitter, al-Shaikh defendeu a proibição dos palestinos de participarem da peregrinação islâmica do haj para Meca. O comentário foi postado depois que apareceu um vídeo mostrando palestinos, no último haj, com bandeiras palestinas entoando, "com sangue, com a alma, nós a recuperaremos, Mesquita de Al-Aqsa!"
Os sauditas têm leis rigorosíssimas que proíbem qualquer atividade política durante o haj. Ao que tudo indica, a percepção de Al-Shaikh é a de que os palestinos usaram a peregrinação à Meca para fazer manifestações, provocar tumultos durante o haj e criar uma saia justa para as autoridades sauditas.
"Os cachorros do Hamas," salientou al-Shaikh, após assistir ao vídeo, "deveriam ser banidos de participarem do haj do próximo ano devido à sua conduta obscena."
Fahd al-Shammari, jornalista saudita, botou a boca no trombone chamando os palestinos de "mendigos sem honra." Ele chegou a ponto de dizer que uma mesquita em Uganda é mais abençoada do que a Mesquita de Al-Aqsa, que é um lugar sagrado dos judeus."
Os palestinos só podem culpar a si mesmos pelo abalo nas relações com os países árabes. A política da ingratidão sempre custou muito caro aos palestinos.
Queimar fotos de dirigentes árabes e chefes de estado nas ruas da Cisjordânia e na Faixa de Gaza mostrou ser um erro crasso. Não é possível simplesmente queimar fotos do príncipe herdeiro da Arábia Saudita num dia e sair voando para Riad no dia seguinte para pedir dinheiro. Não é possível entoar palavras de ordem contra o presidente do Egito num dia e no dia seguinte ir até o Cairo pedir apoio político.
Muitos nos países árabes dizem que já está mais do que na hora dos palestinos começarem a cuidar de seus próprios interesses e pensar num futuro melhor para seus filhos. Eles não consideram mais a questão palestina o principal problema no conflito árabe-israelense. Parece que os árabes estão dizendo aos palestinos: "queremos seguir em frente, vocês podem continuar andando para trás o quanto vocês quiserem."
O que eles estão vendo é a estagnação palestina, principalmente graças aos líderes da Autoridade Nacional Palestina e do Hamas, que estão muito ocupados envenenando as mentes de seus povos e detonando um ao outro, para que sobre tempo para algo positivo. Os palestinos poderão acordar um belo dia e descobrir que seus irmãos árabes realmente não irão mais cair no conto do vigário.
Ahmad al-Jaralah, consagrado editor de um jornal kuwaitiano, foi ainda mais direto, realçando:
"A causa palestina não é mais problema nosso. Nós lhes doamos dinheiro e eles retribuem xingando e se comportando mal. Os árabes e os muçulmanos não aplaudem mais os palestinos. Nós não deveríamos nos envergonhar em estabelecer relações com Israel."
Khaled Abu Toameh é um jornalista premiado radicado em Jerusalém, também é Shillman Journalism Fellow do Gatestone Institute.